A minha patroa dessa época chamava-se Rita de Jesus Reitor e possuía com o Álvaro seu marido, uma barbearia que era frequentada pelos pescadores da Vila e também pelos mineiros do Cabo Mondego. Ainda lá está o prédio agora em ruínas em frente à estátua da Varina.
Cheguei à papelaria Costa no largo do carvão, vindo de Montemor com a minha mala de papelão, onde fui recebido pela D. Rita ( que era empregada nessa papelaria) que com um largo sorriso (que manteve durante a sua vida de mais de 80 anos) me disse que nos iríamos dar bem. E assim aconteceu durante o tempo que trabalhei na sua barbearia, e posteriormente até ao seu falecimento em 27-7-2010.
Eu segui o meu percurso procurando o que me parecia melhor, e estive em outras casas. Na Figueira da Foz fui para a barbearia do Manelzinho, alcunhado de Manelzinho do arroz, que nessa época era frequentada também pelos figueirenses de prestígio, nomeadamente Dr.Tomé, Augusto Silva do Grande Hotel e Piscina,e outros que sempre recordo. O senhor Augusto Silva dava-me boleia no seu Citroen boca-de-sapo para ir ver o Académica-Benfica em Coimbra, assim como o jovem Soto Maior grande ginazista, e também cliente. Dizia-se que tinha fortuna, viajou para o Brasil e ao que parece dissipou esse património (francamente não sei).
Entre os colegas lembro o amigo João Medina, que além de barbeiro também era actor no Teatro de Tavarede.
Mas hoje, o que quis recordar em especial, foi a D. Rita, e a sua estima que nunca se alterou ao longo dos anos, e foram muitos. Eu fui para Lisboa, depois para Braga e voltei para a Figueira em 1978, e também a D. Rita e o marido tinham regressado de África onde tinham vivido alguns anos, mas a descolonisação colocou-lhes a legenda de retornados. Reencontrámo-nos, e reatámos a amizade que só o espaço tinha interrompido. Passei a encontrar-me com o Álvaro todos os Domingos de manhã para um café, até a fatalidade lhe ter batido à porta com uma doença incurável que o vitimou em 2003. Conhecendo bem a verdade, um dia bateu-me no ombro e disse "sei que vai continuar amigo da Rita". Já não sei o que respondi naquele momento, mas sei que ele podia ter a certeza da minha amizade e da minha mulher que passou a considerá-la muito. Algumas vezes a levámos a passear, ela era uma óptima conversadora, para nós era um prazer a sua companhia. Todos somos mortais e actualmente já não está entre nós, só a recordação permanece.
Um dias destes,numa manhã de sol radioso fui ver o mar a Buarcos. Ele batia numa cadência lenta de encontro às rochas. Lembrei-me do Álvaro, lembrei-me da D. Rita, o cemitério estava ali perto, caminhei resoluto e "fui visitá-la". Uma jarra quase tapava a sua fotografia,afastei-a e detive-me a observar o seu sorriso, o tal sorriso que eu guardei e nunca esqueci. Não sou perfeito em orações, mas o meu pensamento elevou-se numa prece simples, e uma lágrima teimosa deslisou. No entanto daí a pouco senti-me calmo, e regressei a casa. Ainda via a D. Rita sorrindo, numa plenitude de tranquilidade e paz, que me envolvia também.
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